Autor: Prof. Ms. José Guilherme de A. Almeida
A DEFICIÊNCIA E O EVANGELHO DE JESUS
Vivemos no tempo da Graça. Com a morte de Jesus na cruz, Sua ressurreição e a propagação do Evangelho para todos os povos, o amor de Deus não está mais restrito ao povo de Israel (Efésios 2:4-13). Porém, mais do que estender a salvação aos gentios, a Graça de Deus também fez novas muitas coisas.
Tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, as pessoas com deficiência (relatadas nas Escrituras como cegos, coxos, gagos, leprosos, etc) viviam a margem de sua sociedade. Em geral, mendigavam pela impossibilidade de conseguir trabalho, como no caso dos cegos e coxos (Lucas 18:35; Atos 3:2), ou eram expulsos de suas cidades para viver em grupos marginais como os leprosos (Números 5:1-4).
Estas práticas se repetiram em muitas outras sociedades ao longo da história, matando, segregando, ou tratando as pessoas com deficiência como manifestação dos deuses (SILVA, 1987).
Tal postura foi sendo modificada ao longo do tempo, inclusive por influências do próprio cristianismo que, na Idade Média, difundiu a ideia do cuidar das pessoas com deficiência, junto das viúvas e dos órfãos, como um ato de caridade, um dever do cristão (cf. SILVA, 1987), seguindo o exemplo de Jesus e dos apóstolos (Mateus 14:14-16; Gálatas, 2:10).
Com o desenvolvimento da ciência e da visão humanista nos primeiros séculos da Idade Contemporânea, a pessoa com deficiência deixou de ser entendida como um ser diferente e começou a ampliar seu valor em relação aos demais indivíduos da sociedade, mas ainda não em caráter de igualdade (COURTINE, 2011).
Atualmente, vivenciamos esta profunda mudança social, que visa valorizar todas as pessoas como seres humanos, dignos das mesmas condições e valor na sociedade. Esta mudança, chamada de processo de inclusão social, atinge profundamente a forma de lidar com a pessoa com deficiência, pois entende que a deficiência não caracteriza a pessoa como um diferente que precisa ser cuidado, um doente que precisa ser curado ou inserido na sociedade, mas sim como um ser humano, com direitos e deveres inerentes a sua existência. Dessa forma, a sociedade é quem tem de se adequar para receber a pessoa com deficiência, independe das possibilidades dela (SASSAKI, 1999).
Para o Cristianismo, esta nova forma de pensar a deficiência significa abandonar algumas crenças sobre as quais as sociedades do Antigo e Novo Testamento foram estruturadas.
Veja em João 9 que, quando Jesus cura uma pessoa com cegueira de nascença, Ele não interpreta aquela deficiência como uma consequência do pecado do homem ou do pecado dos seus pais, mas que ele nasceu assim por permissão de Deus, para que o Seu nome fosse glorificado. Para Jesus, a verdadeira cegueira é não conhecer a Deus. Assim, os fariseus é que eram cegos, pois não enxergavam seus erros.
Sob a luz da Nova Aliança feita por Jesus e do Evangelho da Graça, precisamos compreender que:
1. A deficiência é uma condição humana natural, criada e permitida por Deus;
2. A pessoa com deficiência tem o mesmo valor que a pessoa sem deficiência. Jesus morreu por todos;
3. A pessoa com deficiência precisa receber a Jesus para ter vida eterna; Como diz Paulo: “…todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Romanos 3:23).
As pessoas com deficiência, assim como os gentios e o povo de Israel, precisam conhecer a Jesus e crer em Seu nome para ter a vida eterna. Todos precisamos de salvação!
Cientes disso, vamos falar um pouco sobre a deficiência, seus diferentes tipos e como podemos tornar o Evangelho mais inclusivo, pregando o amor de Deus a todos.
ENTENDENDO O QUE É SER PESSOA COM DEFICIÊNCIA
A forma de se referir a pessoas que tenham algum tipo de deficiência mudou assim como mudou a forma de se relacionar com elas (SASSAKI, 1999). O termo atualmente aceito, tanto pela comunidade de pessoas com deficiência, quanto pela legislação nacional e internacional, é pessoa com deficiência (BRASIL, 2009).
São consideradas pessoas com deficiência, aquelas que possuem algum impedimento de longo prazo – seja de natureza física, mental, intelectual ou sensorial – e que, em interação com uma ou mais barreiras sociais, pode impedir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2015).
Sendo a deficiência uma limitação de longo prazo, ela não é uma doença. Diferente de algo que pode ser curado como um resfriado ou um ferimento, a deficiência é uma condição da natureza humana que faz parte da pessoa que a tem, e ela irá viver com a deficiência, salvo por intervenções de medicina avançada ou pela manifestação do poder de Deus.
Lembre-se que Paulo possuía um espinho na carne pelo qual orou três vezes pedindo a cura e a resposta de Deus foi: “A minha graça te basta, porque o Meu poder se aperfeiçoa na fraqueza” (2 Coríntios 12:7-9).
Isso não significa que Deus não vai ou não pode mudar a condição de uma pessoa com deficiência, mas que como Paulo, muitos irão viver com a sua deficiência aqui na Terra. Os planos de Deus são individuais e Sua vontade é boa, agradável e perfeita (Romanos 12:2). Mais do que cura, a deficiência precisa ser entendida, e a sociedade e a Igreja precisam se adequar para incluir as pessoas que a tem.
A pessoa com deficiência possui diferentes habilidades em relação à pessoa sem deficiência, e realiza as atividades diárias de forma diferente. Uma pessoa com deficiência física que utiliza uma cadeira de rodas se locomove assim como uma pessoa sem deficiência, mas a forma de fazê-lo é que é diferente. Enquanto uma toca a cadeira de rodas, a outra caminha. Cabe a nós criar adequações para possibilitar este jeito diferente, seja na forma de andar, de se comunicar, de aprender, de adorar, etc.
REFERÊNCIAS
BÍBLIA. Antigo e Novo Testamento. Português. 2007. Bíblia do ministro com concordância: Nova Versão Internacional. Traduzida pela Comissão de Tradução da Sociedade Bíblia Internacional. São Paulo: Vida, 2007.
BRASIL. Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. Promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 26 ago. 2009. Disponível em:
______. Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015. Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência). Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 07 jul. 2015. Disponível em:
COURTINE, Jean-Jacques. O corpo anormal: história e antropologia culturais da deformidade. In: COURTINE, Jean-Jacques. (Org.). História do corpo: as mutações no olhar: o século XX. 4. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011. vol. 3.
SASSAKI, Romeu K. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 3. ed. Rio de Janeiro: WVA, 1999.
SILVA, Oto Marques da. A epopéia ignorada: a pessoa deficiente na história do mundo de ontem e de hoje. São Paulo: Cedas, 1987.